Visualizações de página do mês passado

terça-feira, 17 de abril de 2012

O encontro

Ela abriu os olhos e ainda não tinha noção do lugar que

estava.

“Que dia é hoje?” – Pensou.  

Dia 02/11Dia de finados.
Lembrou.
Alguma coisa a levava, ela
não podia ir contra a
 correnteza, também não
tinha forças para tal
empreitada.
“Será que estou morta?” – Pensou. – “Não, ninguém
morre no dia de finados, no dia dos mortos faz-se
homenagem a estes. “Deixa isso pra lá.”
Naquele dia 02, lembrava-se de ter acordado relativamente
cedo, ainda na sua cama podia ver o lado de fora, o dia
 estava chuvoso, o céu em tons de cinza e alaranjado.
 Adorava a chuva, o barulho, a cor que o céu ficava, a
 calmaria da rua, era tudo fantasticamente bonito e
 melancólico.

Demorou a levantar-se da cama, ficou ali, a admirar a chuva,
 a chuva que tudo lava. E sentiu que aquela chuva lavava
 também as dores que estavam dentro de si.
Espreguiçou-se e levantou, deu bom dia a sua mãe, realizou
 sua rotina matinal, após o café da manhã, tinha muitas
 coisas a resolver.
O dia foi atarefado e passou rápido.
À noite, havia previsto sair com uns amigos, mas a chuva as
 6h da tarde que mais parecia um diluvio, não permitiu.
Foi para o seu quarto, decidiu ler um pouco, estava lendo
 Kafka – A metamorfose, e lá estava ela se

metamorfoseando.
Não se lembrava o que houve depois, deve ter pegado no
sono e estar sonhando...
De repente viu outros corpos serem levados, como o dela,
parecia estar em um rio de almas, todos ali tranquilos,
esperando sua sorte.
Ela estava sonhando, disso não tinha duvidas, estava tendo
 uma experiência de morte, mas ainda assim, sonhando.
Tudo parou rapidamente, os corpos pararam de se mover,
ela parou de pensar, o tempo parou, ficou tudo congelado.
Alice podia ver agora dois anjos, os dois eram bonitos e
transmitiam uma paz que ela nunca imaginou ser possível
existir, ao redor deles a áurea brilhava e iluminava todo o
 lugar.
Estavam conversando, pareciam decidir algo e de fato
decidiam, decidiam o destino de todos ali.
Não sabia que era assim, todas as noites do dia 02 de
 novembro, todas as almas iam até o rio das almas e lá os
 anjos decidiam seus destinos. Alguns não voltavam mais,
 outros voltavam e voltavam todos os dias por muitos anos,
 alguns voltavam a vida ainda para terminar algo, mas o anjo
 da morte não lhes dava muito tempo, outros tinham o dia,
 hora, local, modo de morte já definido e os anjos não se
incomodavam e trazê-los novamente até que chegasse o dia
do encontro real.
Ela havia tido aquele sonho algumas vezes durante seus 25
 anos de vida, mas só hoje havia descoberto do que se
 tratava, seria isso bom?
Ficou ali, o tempo parado, apenas os anjos se moviam e
 falavam, pôde ver umas poucas almas se juntarem aos
 anjos, antes de despertar ás 7h da manhã, totalmente
 relaxada, a vida continuava.
Apesar do sonho estava bem, a noite havia sido de reposição
 de energias.
Dois anos se passaram, as decepções continuaram, os dias
 passavam como tinham de passar, mas todos os dias
 esperava alguém que não conhecia, alguém que não sabia
 quem era.
Estava nas férias de dezembro, viajou, aquele ano queria
 passar todos os dias na praia, algo lhe dizia que lá
 encontraria o que há anos esperava.
Passeava pela praia quando decidiu dar um mergulho, o mar
 sempre se apresentava como algo fantástico, ao mesmo
 tempo calmo e revolto.
Não se deu conta do quanto estava longe, e agora olhando
 para a praia, a volta parecia difícil, ficou ali deixando-se levar
 pela maré. Parecia um sonho, lembrou-se do sonho do dia
 de finados à dois anos atrás, que bom era deixar-se levar
pela correnteza, fechou os olhos. E ao encontrar aquele que
 ela esperou a vida inteira, deram-se as mãos e partiram.