estava.
“Que dia é hoje?” – Pensou.
Dia 02/11 – Dia de finados.
Lembrou.
Alguma coisa a levava, ela
não podia ir contra a
correnteza, também não
tinha forças para tal
empreitada.
“Será que estou morta?” – Pensou. – “Não, ninguém
morre no dia de finados, no dia dos mortos faz-se
homenagem a estes. “Deixa isso pra lá.”
Naquele dia 02, lembrava-se de ter acordado relativamente
cedo, ainda na sua cama podia ver o lado de fora, o dia
estava chuvoso, o céu em tons de cinza e alaranjado.
Adorava a chuva, o barulho, a cor que o céu ficava, a
calmaria da rua, era tudo fantasticamente bonito e
melancólico.
Demorou a levantar-se da cama, ficou ali, a admirar a chuva,
a chuva que tudo lava. E sentiu que aquela chuva lavava
também as dores que estavam dentro de si.
Espreguiçou-se e levantou, deu bom dia a sua mãe, realizou
sua rotina matinal, após o café da manhã, tinha muitas
coisas a resolver.
O dia foi atarefado e passou rápido.
À noite, havia previsto sair com uns amigos, mas a chuva as
6h da tarde que mais parecia um diluvio, não permitiu.
Foi para o seu quarto, decidiu ler um pouco, estava lendo
Kafka – A metamorfose, e lá estava ela se
metamorfoseando.
metamorfoseando.
Não se lembrava o que houve depois, deve ter pegado no
sono e estar sonhando...
De repente viu outros corpos serem levados, como o dela,
parecia estar em um rio de almas, todos ali tranquilos,
esperando sua sorte.
Ela estava sonhando, disso não tinha duvidas, estava tendo
uma experiência de morte, mas ainda assim, sonhando.
Tudo parou rapidamente, os corpos pararam de se mover,
ela parou de pensar, o tempo parou, ficou tudo congelado.
Alice podia ver agora dois anjos, os dois eram bonitos e
transmitiam uma paz que ela nunca imaginou ser possível
existir, ao redor deles a áurea brilhava e iluminava todo o
lugar.
Estavam conversando, pareciam decidir algo e de fato
decidiam, decidiam o destino de todos ali.
Não sabia que era assim, todas as noites do dia 02 de
novembro, todas as almas iam até o rio das almas e lá os
anjos decidiam seus destinos. Alguns não voltavam mais,
outros voltavam e voltavam todos os dias por muitos anos,
alguns voltavam a vida ainda para terminar algo, mas o anjo
da morte não lhes dava muito tempo, outros tinham o dia,
hora, local, modo de morte já definido e os anjos não se
incomodavam e trazê-los novamente até que chegasse o dia
do encontro real.
Ela havia tido aquele sonho algumas vezes durante seus 25
anos de vida, mas só hoje havia descoberto do que se
tratava, seria isso bom?
Ficou ali, o tempo parado, apenas os anjos se moviam e
falavam, pôde ver umas poucas almas se juntarem aos
anjos, antes de despertar ás 7h da manhã, totalmente
relaxada, a vida continuava.
Apesar do sonho estava bem, a noite havia sido de reposição
de energias.
Dois anos se passaram, as decepções continuaram, os dias
passavam como tinham de passar, mas todos os dias
esperava alguém que não conhecia, alguém que não sabia
quem era.
Estava nas férias de dezembro, viajou, aquele ano queria
passar todos os dias na praia, algo lhe dizia que lá
encontraria o que há anos esperava.
Passeava pela praia quando decidiu dar um mergulho, o mar
sempre se apresentava como algo fantástico, ao mesmo
tempo calmo e revolto.
Não se deu conta do quanto estava longe, e agora olhando
para a praia, a volta parecia difícil, ficou ali deixando-se levar
pela maré. Parecia um sonho, lembrou-se do sonho do dia
de finados à dois anos atrás, que bom era deixar-se levar
pela correnteza, fechou os olhos. E ao encontrar aquele que
ela esperou a vida inteira, deram-se as mãos e partiram.